Depois de muito tempo sem notícias, cá estou.
Bem, hoje é o sexagésimo quarto dia desde que cheguei aqui. De lá pra cá já deu pra fazer um monte de coisas. Já fui duas vezes a Busan visitar Eun Bee e, da última vez, José, um amigo que veio da Costa Rica, foi junto, já que Eun Bee não poderia ficar durante dois dias comigo, ela decidiu por bem que um amigo fosse para que não me sentisse sozinho.
E, em falando do feriado, este é o mais amado pelos coreanos. Em coreano, chama-se Chusök, 추석, 秋夕. É uma mistura de Festival da Colheita com Admiração da Lua e Dia de Finados. Acontece durante a primeira lua cheia do outono e dura quatro dias. Durante este período, muita gente vai para a terra natal, para preparar muita comida, principalmente uns bolinhos de massa de arroz e fazer as honras para os antepassados e para os mais velhos. As crianças adoram isso porque ganham muito dinheiro de presente. É comum ganharem mais ou menos por volta de cem dólares dos tios e dos avós. É como um agradecimento e um incentivo dos mais velhos para que os mais jovens se esforcem nos estudos. A partir do momento que os jovens passam a trabalhar, aí é a vez deles fazerem o mesmo com os sobrinhos.
Quanto às aulas, começaram na primeira segunda-feira de setembro, quando fizemos o teste de colocação. Fiquei entre o intermediário 1 e básico 2 e acabei entrando no básico 2 mesmo. Sentia que a gramática não era problema, mas o vocabulário sim. De qualquer forma, as aulas foram indo, indo, e agora, quase dois meses depois de começar o estágio, estamos a ponto de terminá-lo. Esta será a última semana de aula do básico 2. Após a prova, já começaremos o intermediário 1.
Temos quatro horas de aula divididas igualmente por duas professoras. A primeira, mais velha e mais séria, e a segunda, mais jovem e mais engraçada. Acho que é um bom equilíbrio. Escrevemos e estudamos mais com a primeira, e praticamos mais com a segunda. As aulas são todas em coreano, o que no começo é um problema, mas que é logo ultrapassado. Acostumei-me rapidamente à língua dentro da sala de aula. Claro que as professoras não falam um coreano rebuscado e requintado; é bem simplificado e mais devagar que o normal. Fico muito feliz, pois consigo entender 90%. No entanto, quando a conversa é de verdade, ainda é um pouco difícil de entender o que é dito. Quanto à minha comunicação oral, está bem melhor do que quando estava no Brasil, já que aí não falava nada... Qualquer coisinha já é melhor que nada, mas ainda é-me difícil expressar o que quero dizer. Mesmo perguntas relacionadas à aula, ainda são difíceis de ser formuladas. De qualquer forma, já estou feliz.
Um problema que tenho que enfrentar é a falta de uso da língua fora do ambiente da sala-de-aula. No dormitório, kisuksa (caso me escape a palavra em coreano daqui pra frente), a língua oficial é o "inglês". Como há muita gente que vem pra cá de alegre só pra estudar em inglês, não dá pra usar outra língua. A segunda oficial é o chinês e a terceira, o russo. De resto, sobram as línguas das minorias e o espanhol que a maior das minoritárias. Quanto ao russo, é muito interessante que aqui há muitas pessoas do centro e leste da Rússia além de muitas das ex-repúblicas da União Soviética e do ex-bloco soviético. É muito comum ver pessoas com feições orientais falando em russo. Há gente do Uzbequistão, Cazaquistão, Quirguistão, Lituânia, Ucrânia, Polônia, Bulgária, República Tcheca, Eslováquia, os quais todos falam em russo com o pessoal da Rússia e entre si. Mesmo as pessoas dos -Istões, preferem falar entre si em russo do que em suas próprias línguas.
E falando em -Istões e etcéteras, devo admitir que temos um kisuksa bem internacional. Tenho como vizinhos diretos dois chineses, um tcheco, um eslovaco e um nepalês. Logo ao lado, um taiwanês, um costarriquenho, outro tcheco. Um pouco mais longe, mas ainda no mesmo andar, temos exemplares do Camboja, Mongólia, Paquistão, Afeganistão, Cazaquistão, Bangladesh, Rússia... e China. No andar de baixo, um marroquino, um argelino, alguns indianos, um casal de alemães, outras etnias mais... e bilhões de chineses. Isso do que me lembro agora. Tem muito mais, mas não me vem à memória.
Há ainda um outro prédio, International House 2 (já que o meu prédio se chama International House 1). Lá temos mais outros exemplares: Lituânia, Polônia, Chile, México, Itália, Argentina, a outra única brasileira, Uzbequistão, Rússia, Etiópia, Líbano, Israel, outras etnias... e bilhões de chineses.
Logo à frente da IH2, há o kisuksa dos kyopos (NT: Kyopo - DNA coreano que, por acaso, cometeu o erro de nascer em outro país.) Lá tem gente de tudo quanto é canto... e também da China.
Nosso dormitório é sito à Rua da Universidade, em coreano Dehangno, 대학로, 大學路, chamada assim por ter sido construída onde havia sido outrora um câmpus universitário. Aqui é a "Bróduei" coreana. Deve ter a maior taxa percápita de teatros por habitante. Há, iscrusíveu, no próximo finde semana (como costumava escrever uma amiga), uma apresentação do Grupo Corpo, apresentado como grupo brasileiro de dança, cujos cartazes estão espalhados por toda a extensão da rua (a qual não é tão extensa assim).
Daqui de casa até o Dongdemun (동대문, 東大門) é um tirim dispingarda, é dois-palito. Acho que não dá nem 15 minutos caminhando calmamente pela floresta urbana. Dito Dongdemun é mais ou menos uma 25 de Março tamanho-família. Na época dos antigamentes, era onde a cidade começava ou acabava, dependendo de que lado do portão você estivesse. A propósito, Dongdemun significa literalmente (ou seria ideograficamente?) "Grande (Milenar) Portão do Leste" (o milenar é por conta do Thiago). Conseqüentemente, era onde se reunia um monte de gente pra entrar e sair da Capital (já que a tradução do nome Seul é capital - bem criativo, né?), gente chegando de outras regiões, outros reinos e outras localidades milenares do extremo oriente (que não parece tão longe quando se está aqui). O que que deu tudo isso? Muito bem quem respondeu um milenar mercado asiático! Aí está! Com a evolução e o desenvolvimento coreanos, a região também se desenvoveu e agora é uma mistura de mercado típico asiático, tipo filme de luta na Tailândia/Hong Kong/China e adjacências, com lojas de departamento, no mais alto estilo shopping center vertical. Há de tudo: de naftalina a ginseng vermelho; de rádio valvulado a roupas de grifes internacionais. Tudo permeado pelo mais vermelho odor de pimenta advindo dos bilhões de barraquinhas de comida espalhadas em cada vãozinho de rua que não tem carro ou gente.
A propósito, a comida coreana é animal! À primeira vista, para o desavisado, dá impressão que eles adoram ketchup e molho de tomate. É tudo vermelhinho bonitinho... Mas o vermelhinho bonitinho nada mais é que pó/pasta de pimenta malagueta colocado desavergonhadamente nas comidas. Para mim, isso é o paraíso!!! Adoro comida picante. Mas, tem gente por aqui que não está acostumada e passa por belos apuros gastronômicos. Esses dão-se por satisfeitos com as típicas redes de fast-food estadunidenses como Mekdonaldü ou Kei-Epü-Shi... Mas, essas não se dão por rogadas, e também oferecem ao palganófobos (palgan é vermelho em coreano) saquinhos de pimenta para que possam pôr um gostinho em seus sanduíches insossos. Coitadinhos...
Bem, voltando ao Grande Portão (Milenar) do Leste, pode-se comprar de tudo e mais um pouco por lá. (...)
Justamente neste ponto, Eun Bee me telefonou e começamos a conversar. Como temos um "Pinky Couple Plan", podemos falar-nos por 500 minutos e ainda enviar 500 mensagens de texto cada um por mês por uma tarifa básica de 25000 wons, o que dá pouco mais que R$ 50,00. Por isso, não economizamos no telefone. Conversamos um bom tempo e terminando já estava muito tarde pra continuar a escrever...
Hoje, dia 21 de outubro, levantei-me ao meio-dia! Onze horas de sono bem dormido... Durnate a semana, normalmente, tenho dormido por volta de seis horas e, quando chega o finde semana, tenho que tirar o atraso. Como acordei com muita fome, fui direto à cozinha e fiz meu Miso Ramyön e comi deliciosamente em meu quarto, ouvindo Adriana Calcanhoto. Ao mesmo tempo que meu vizinho do lado ouve música nepalesa e o cara da frente escuta alguma coisa em inglês. Agora, na cozinha, algum chinês prepara seu almoço também, que, a propósito, normalmente tem um aroma um tanto quanto peculiar. Não sei o que cozinham, mas normalmente o cheiro é bem particular mesmo. É um mistério...
Falando do dormitório, o mesmo é um edifício de 4 andares brasileiros e 5 andares coreanos. Na Coréia, o térreo é o primeiro andar.
Bem, logo na entrada, como é de praxe em toda o país, está o quartinho do porteiro/zelador, o famoso ajösshi, o qual deve zelar pelo bom funcionamento do estabelecimento; mas os ajösshis normalmente estão dormindo, comendo ou assistindo TV. Ajösshi é uma palavra para "tio" que é usada para qualquer pessoa mais velha. Inclusive entre eles próprios. O contra-ponto do ajösshi, é a ajumma. O país está invadido por eles em todos os cantos. Principalmente quando se está no banheiro masculino e a ajumma fica limpando o chão, tudo palli-palli (rápido-rápido), palavra que é a mais usada em todo o território nacional.
No primeiro e no quinto andares, encontram-se salas de pesquisa do Departamento de Medicina da Universidade de Seul. Fazem pesquisas genéticas e de células-tronco. O quinto andar é um mistério, ninguém sabe o que tem lá. No segundo, fica uma parte do dormitório da Universidade de Seul. O terceiro e o quarto andares são o dormitório dos KGSS, Korean Government Scholarship Students, ou seja, Estudantes Bolsistas do Governo Coreano: nóis! Depois de uma rápida passagem pelo ap 321, atualmente assisto ao quarto de número 422. Não é nada mal, principalmente pelo preço. Pago mensalmente 138000W o que dá mais ou menos R$ 300,00. Com isso, tenho uma folguinha no orçamento. O único problema é que, como o prédio é antigo, não temos ar-condicionado. Isso é um problema no verão, pois os quartos se tornam altos-fornos de derretimento de minério de ferro. Ainda bem que o verão passou rapidinho e de agora em diante a temperatura vai cair.
Falando em temperatura baixa, agora estou com bermuda e camiseta. Quase em novembro, ainda não fez frio. Tem muita gente fraquinha que põe um monte de blusa por aí, mas eu não consigo. A única vez que coloquei uma blusa foi quando fomos beber no terraço do dormitório até as 2 horas da manhã. Aí estava um pouquinho frio. Fora isso, acordo de manhã, a cerração e o ar fresco do outono de Minas, e eu de camiseta me refrescando, sabendo que logo mais, depois de algumas horas, o sol subirá impiedoso e lançará suas chamas contra os desavisados portadores de agasalhos que se deixaram levar pelo frescor da aurora. Esses, então, estarão todos suando e reclamando, ao passo que eu feliz da vida estarei com minha camiseta.
(Daqui a pouco meus amigos da Costa Rica e de Taiwan virão a meu quarto para que juntos vamos comer alguma coisa. Como desjujei há pouco, creio que apenas os acompanharei, aproveitando a deixa para sair de casa e fazer algo mais útil. Assim que retornar, tomarei as devidas providências para que continue a escrever esta pequena mensagem.)
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